quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Sepultura finaliza disco inspirado em Laranja Mecânica


Por Marcos Marçal

Reportagem do UOL Música

O Sepultura acaba de finalizar a mixagem de seu novo álbum, A-Lex ("Sem lei", em latim), ainda sem data de lançamento definida. A banda recebeu a imprensa nessa quinta-feira (7) em um estúdio na zona oeste de São Paulo para apresentar o disco em primeira mão.

A-Lex é 12º disco do Sepultura e o primeiro sem a participação dos irmãos Cavalera, Max (voz e guitarra) e Iggor, que formaram a banda em 1984 junto a Jairo Guedz (guitarra) e Paulo Jr. (baixo) --apenas esse último faz parte da formação atual do grupo. Os dois irmãos atualmente tocam juntos no Cavalera Conspiracy.

A formação atual do Sepultura é capitaneada por Andreas Kisser (guitarrista da banda desde 1987) e também conta com Derrick Green (vocalista desde 1998) e Jean Dolabella (bateria), que estréia com o grupo em disco, além de Paulo Jr (baixo).

Assim como em "Dante XXI" (2006), álbum anterior baseado em "A Divina Comédia" (de Dante Alighieri), o Sepultura também se inspirou em um clássico da literatura neste novo disco. As canções de A-Lex remetem a Laranja Mecânica (A Clockwork Orange, de 1962), livro do escritor inglês Anthony Burgess que conta a história do personagem Alex De Large --um fictício adolescente de quinze anos, amante de música clássica (principalmente a "Nona Sinfonia" de Beethoven), sexo e violência extrema. A história é mais conhecida pelo filme de Stanley Kubrick, de 1971.

Andreas Kisser fala sobre a escolha do livro para conceituar o novo trabalho do Sepultura. "Achamos muito mais interessante trabalhar nosso imaginário em relação a um futuro sujo, sem lei e caótico como o de 'Laranja Mecânica' do que propriamente nos inspirarmos em alguma banda de heavy metal. Assim que o conceito foi definido, mergulhamos na obra e escrevemos as músicas aleatoriamente. O disco foi feito rapidamente", explicou.

A-Lex apresenta 18 faixas em aproximadamente uma hora de música. A banda optou por trabalhar em um repertório estruturado com poucos refrões e solos, conforme comentou o baterista Jean Dollabela. "Foi um processo natural, pois o repertório surgiu a partir de improvisações em estúdio durante três meses. Além disso, nós procuramos fugir dos clichês de estrutura de composição e não nos preocupamos com riffs, refrões e coisas do tipo", declarou.

Dialeto "Nadsat"
Para manter um padrão de fidelidade à obra original, até mesmo um dicionário foi utilizado para a elaboração de algumas letras do novo disco, que utilizam alguns termos do dialeto Nadsat (o equivalente ao termo "adolescente" em russo, traduzido ao português) inventado por Burgess a fim de caracterizar o vocabulário peculiar de Alex. O garoto utiliza gírias do linguajar cockney, típico da classe operária britânica e marginais londrinos, misturadas a palavras no idioma russo e dialeto cigano.

Como o livro de Burguess, A-Lex também é dividido em partes. Cada uma delas narra diferentes passagens da história de Alex De Large. Dante XXI (2006) também era dividido em partes (Inferno, Purgatório e Paraíso).

Dividida em cinco músicas, a primeira parte do disco retrata a violência extrema, sem limites, do protagonista. Alex lidera uma gangue de delinqüentes juvenis que espanca, estupra, mata e comete todo tipo de atrocidades. Essa violência é representada na mistura de metal e hardcore característica do Sepultura, à exceção de fraseados em violão de nylon em We've Lost you.

Após a traição de um de seus companheiros, Alex é preso e condenado a vários anos de cadeia. A repressão ao comportamento do personagem é retratada em trecho de What I Do, faixa que fecha a primeira parte do álbum, quando o vocalista Derrick Green encarna A-Lex gritando a frase That's what I do, I do what I like to do! What did I do to deserve this? (algo como "Aquilo é o que eu faço e faço porque gosto! O que eu fiz para merecer isso?").

Mas os atrativos musicais de A-Lex são a segunda e terceira partes do disco, que representam o inferno pessoal vivido pelo personagem do livro de Burgess.

Dividida em seis músicas, a segunda parte mostra a prisão, o delírio induzido pelas drogas e a terapia do protagonista pelo "Método Ludovico". Como forma de atenuar sua pena, Alex aceita submeter-se como cobaia de um "tratamento experimental para refrear seus impulsos destrutivos", uma espécie de "lavagem cerebral" induzida por drogas e condicionamento psicológico. Green canta my blood is cold ("meu sangue é frio") em The Treatment.

Metamorphosis começa com andamento lento e guitarra sem distorção, uma sonoridade distinta ao Sepultura tradicional. E temas como Sadistic Values, Forceful Behaviour e Conform evidenciam o processo de "transformação" do personagem.

Rock orquestral
A terceira parte é dividida em cinco músicas e apresenta o personagem pagando por todos os seus pecados, uma vez que a terapia de aversão lhe provoca repulsa a tudo aquilo que apreciava anteriormente (sexo, violência e música clássica).

Sonoramente, destacam-se The Experiment e Ludwig Van. O primeiro apresenta influências do grupo britânico surgido no final dos anos 70 Killing Joke, enquanto o último é uma releitura da Nona Sinfonia de Beethoven em que o Sepultura toca com uma orquestra de doze músicos regidos pelo maestro Alexei Kurkdjan.

O baterista Jean Dolabella ressaltou que o mais difícil foi trabalhar a parte orquestrada do disco. "Não gravamos juntos, mas foi trabalhoso organizarmos as coisas. Não soa como uma mera colagem de música clássica e rock pesado. A música flui facilmente", declarou.

Capítulo não retratado no filme
Ao final do livro de Burgess, Alex é abandonado por todos e sua situação se reverte com a ajuda de uma das vítimas de sua crueldade. Esse capítulo não consta no filme de Kubrick, mas a banda o representa com a música Paradox, de acordo com a proposta original de Burgess.

O Sepultura tomou a liberdade poética de separar o último capítulo do livro como uma quarta parte porque é um trecho importante na narrativa de Burgess que Stanley Kubrick não aproveitou em seu filme.

Kisser falou sobre o que considera a mensagem final de "Laranja Mecânica". "O capítulo final é quando nos questionamos se temos ou não livre escolha. Vivemos tão controlados por religião, pecados, e nos impõem tantos limites antes mesmo de nascermos. Aí é muito difícil nos libertamos disso tudo. E todo mundo faz besteira durante a adolescência, pois nós só aprendemos mesmo na base da porrada. Mas, ao passar por todos aqueles experimentos, Alex se torna ainda pior do que era antes e só se cura após a tentativa de suicídio. O personagem só se torna uma pessoa melhor sem a imposição por parte das instituições que o tentavam controlar anteriormente", conclui.

O Sepultura ainda não sabe quando começa a promover o novo repertório em turnê. Em 23 de agosto, a banda fará um show fechado para seu fã-clube. Duas músicas de A-Lex, The Treatment e What I Do!, já estão sendo apresentadas em shows recentes do Sepultura, que ainda promove o disco Dante XXI.

3 comentários:

Túlio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Túlio disse...

Ansioso por esse disco. Boa temática, excelente escolha de título e, por enquanto, sem estardalhaços. Mesmo não tendo mais nenhum Cavalera, acho que vai ser no mínimo tão bom quanto o Dante XXI (que é excelente, apesar de fugir das Raízes do Sepultura :P ).

ninguém disse...

guilherme, quando esse cd sair, compre 2 sem querer e me venda o segundo por 20 reais, ok?
hehehe