sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Richie Kotzen: Nem exibicionismo, nem solos


Por Rafael Sartori (Rock Online)


Quase todos os guitarristas começam em alguma banda, com solos e temas mais simples e ingênuos. Com o passar dos anos, vão melhorando sua técnica, adquirindo experiência, maturidade e acabam por lançar álbuns solos instrumentais muitas vezes complexos e intrincados. Richie Kotzen não. Aos 19 anos de idade ele já estava em um nível técnico que a esmagadora maioria dos guitarristas nunca vai chegar durante toda a vida. Era contratado da Shrapnel Records - sonho de dez entre dez guitarristas dos anos 80 - tinha um bom álbum solo instrumental (produzido por Jason Becker e com Stuart Hamm no baixo e Steve Smith na bateria) e uma vídeo-aula lançada pela REH, onde fazia ‘sweeps’ e ligados absurdos. Tudo isso em 1989.


É difícil imaginar como é ter o total domínio do instrumento ainda tão jovem. Ele poderia passar a vida em cima das habilidades que já havia adquirido, tornando-se um ‘shredder’ de carteirinha, impressionando os mais novos e servindo como “modelo a ser batido” pelos mais experientes. Mas mesmo aos 19, os solos de guitarra já não bastavam para Richie Kotzen. No ano seguinte, ele surpreendeu a todos com “Fever Dream”, um álbum calcado no Funk, Soul e Blues cheio de ‘groove’ e personalidade. O mais impressionante é que o próprio Kotzen cantava as músicas de forma ímpar, com um timbre difícil de se ouvir por aí e afinação impecável. Os solos ainda apareciam, mas o foco eram os refrãos pegajosos e as linhas ‘swingadas’.


A carreira de Richie Kotzen tomou esse rumo e foi assim por um bom tempo, com destaque absoluto fica para o genial “Mother Heads Family Reunion”, de 1994. A exceção é sua participação no álbum “Native Tongue”, do Poison, onde compôs a excelente balada “Stand” e deu uma cara mais adulta para o grupo. Ele também fez a turnê de despedida do Mr. Big no lugar de Paul Gilbert e, só por diversão, aumentava o grau de dificuldade das músicas (que já era relativamente alto) e tocava a famosa introdução de “Green Tinted Sixties Mind” palhetando e não fazendo ‘tappings’, como Gilbert fazia, ou fazendo o solo de “Colorado Bulldog” nas costas, com a guitarra por cima dos ombros. Para piorar, usando uma Telecaster!


Aos poucos, Richie Kotzen foi deixando os solos de lado. Às vezes, nem mesmo tocava, apenas cantava. Gravou muitas músicas acústicas e acabou fazendo shows neste formato e até lançando um disco, “Acoustic Cuts” (2003). Era incrível saber do que Richie Kotzen era capaz de fazer com uma guitarra nas mãos e, mesmo assim, vê-lo feliz no palco apenas com um microfone, um banquinho e um violão, fazendo platéias cantarem suas canções junto com ele. Até mesmo nos ‘workshops’ que faz mundo fora (felizmente presenciei um deles na EM&T) o guitarrista fala mais sobre métodos de composição e timbres e não se porta como muitos que se acham ‘guitar heroes’. Quando demonstra alguma técnica, ao invés dos solos velozes e complicados, faz levadas com a mão direita na guitarra ‘clean’. Vale citar que ele também toca, e muito bem, bateria, baixo e piano.


Por sorte nossa, Richie Kotzen gosta do Brasil e já fez algumas apresentações por aqui, e lançou recentemente um álbum e um DVD ao vivo gravados em São Paulo. Se você gosta de música de qualidade e performances que beiram à perfeição, tanto nos vocais quanto na guitarra, fique atento. Músicos como Richie Kotzen são raríssimos, colocam sempre a arte em primeiro plano, e merecem ser apreciados.