domingo, 1 de março de 2009

Os novos ouvintes VS o prazer de colecionar discos



Por Thalles Breno, do Collector's room


Três momentos me chamaram a atenção nas últimas semanas para o mesmo assunto: a paixão dos colecionadores de discos pela música. O primeiro foi quando recebi semana passada o álbum Vile dos carniceiros do Cannibal Corpse e ao abrir descobri que a capa censurada estava apenas no slipcase. O encarte, para minha grata surpresa, trazia a capa original.


Outro episódio foi quando estava lendo a coluna "Stay Heavy Report", assinada por Vinícius Neves e Cíntia Diniz, que consta na edição #117 da revista Roadie Crew. A matéria aborda capas de trabalhos de heavy metal em geral que foram censuradas e, como exemplo, traz Virgin Killer e Street Survivors, respectivamente do Scorpions e do Lynyrd Skynyrd. Lá é feito um relato bem interessante explicando os motivos de tais capas terem sido censuradas.


Um outro fato foi quando ao voltar de uma loja de CDs, feliz da vida por ter adquirido novos itens para a coleção, conversava com um colega acerca de MP3, pen drives e afins. Ele comentava o quanto tinham sido boas essas invenções, pois a praticidade é muito grande, dentre outras vantagens. Até aí tudo bem, mas quando ele mencionou que tais modernidades (sem querer ser demasiadamente nostálgico) eram melhores que o CD em si tivemos de discordar por razões mais do que óbvias para qualquer colecionador de discos que se preze.




No dia seguinte era feriado aqui onde moro e aproveitei para dar uma reorganizada na minha coleção. Tirei tudo da estante, limpei, coloquei de novo, guardando os novos itens em seus devidos lugares, observei algumas capas ... tudo isso ao som do bom e velho Iron Maiden. Foi uma manhã quase toda nisso, e depois de terminado fiquei admirando o acervo, vendo quais itens ainda faltavam, quais seriam as possíveis novas aquisições, e então lembrei do assunto MP3 e os outros fatos já mencionados no início desse texto e me perguntei o que essa galera que vive dando cliques em links para fazer downloads de discos está perdendo ao tratar a música apenas como algo virtual, sem ter em mãos um trabalho original. Parecem simplesmente ignorar o fato de existir uma obra visual que, principalmente no rock e metal, é tão importante e na grande maioria das vezes intimamente ligada ao conceito do álbum.


Muitos desses não conhecem capas de discos, nomes de músicas, qual a formação que gravou aquele trabalho, quem foi o produtor, em qual estúdio foi gravado, quais as pessoas e bandas mencionadas na lista de agradecimentos, se no show do ano tal o guitarrista x ainda estava no grupo, onde fica tal teatro que tal banda gravou aquele show para lançar em DVD. Isso é a história da música e não pode ser simplesmente ignorada.


É bastante comum nas rodas de conversa entre os “downloaders" (chamemos assim) muitos deles orgulhosos, ostentando a proeza de terem em seu acervo discografias e discografias de vários e vários grupos do cenário mundial. Mas será que conhecem todos os arquivos que possuem? Com a velocidade em que a informação em nossos dias alcança, fica praticamente impossível assimilar todos esses trabalhos a ponto de se ter uma visão crítica de cada um. Ouve-se o arquivo uma vez e já se passa para outro, pois ainda existe uma pilha de DVDs lotados de MP3 para escutar. Ouvir uma vez apenas e pronto? E trabalhos mais intrincados como das bandas de rock progressivo?


Lembro-me de um tempo não muito distante quando a moda aqui era gravar fitas K7 com o maior número de músicas de grupos diferentes possíveis, para que depois se pudesse dizer de cabeça erguida: “tenho 327 bandas gravadas na minha coleção”. Essa galera nunca ouviu um álbum completo na vida, talvez. E onde fica a música nessa história toda? Recebe seu devido valor? Ou vira mais uma imagem no álbum de figurinhas desse pessoal?


É verdade que o MP3 tem sua importância, afinal é extremamente útilo quando existe alguma dúvida quanto ao som de alguma banda nova que se ouve falar, ou para ter certeza de que o álbum novo de determinado grupo está legal. O MP3 é um teste para você decidir se compra ou não, e é útil para ouvir no seu iPod em academias, caminhadas, viagens, no carro e em tantas outras situações. Mas ficar sempre usando esse formato de baixa qualidade (sim, pois o MP3 não tem a mesma qualidade do CD, isso para não mencionar o disco de vinil, que, aliás, ainda que timidamente, está voltando a ter seu lugar de forma mais presente, ainda que nunca o tenha perdido), sequer imaginar como é a capa de tal álbum, que relação a mesma tem com o trabalho, é frustrante, fazendo passar batido detalhes que só um disco original traz de forma satisfatória.


A pergunta que surge é: que geração de fãs está se formando hoje? Seriam chamados de apreciadores de música? E nem adianta usar a justificativa de que só a música basta, pois é um argumento deveras pobre, ou um enólogo despreza a garrafa, o rótulo e a rolha de um bom vinho?

Vou para casa ouvir meu CD original do Testament, The Formation of Damnation.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Richie Kotzen: Nem exibicionismo, nem solos


Por Rafael Sartori (Rock Online)


Quase todos os guitarristas começam em alguma banda, com solos e temas mais simples e ingênuos. Com o passar dos anos, vão melhorando sua técnica, adquirindo experiência, maturidade e acabam por lançar álbuns solos instrumentais muitas vezes complexos e intrincados. Richie Kotzen não. Aos 19 anos de idade ele já estava em um nível técnico que a esmagadora maioria dos guitarristas nunca vai chegar durante toda a vida. Era contratado da Shrapnel Records - sonho de dez entre dez guitarristas dos anos 80 - tinha um bom álbum solo instrumental (produzido por Jason Becker e com Stuart Hamm no baixo e Steve Smith na bateria) e uma vídeo-aula lançada pela REH, onde fazia ‘sweeps’ e ligados absurdos. Tudo isso em 1989.


É difícil imaginar como é ter o total domínio do instrumento ainda tão jovem. Ele poderia passar a vida em cima das habilidades que já havia adquirido, tornando-se um ‘shredder’ de carteirinha, impressionando os mais novos e servindo como “modelo a ser batido” pelos mais experientes. Mas mesmo aos 19, os solos de guitarra já não bastavam para Richie Kotzen. No ano seguinte, ele surpreendeu a todos com “Fever Dream”, um álbum calcado no Funk, Soul e Blues cheio de ‘groove’ e personalidade. O mais impressionante é que o próprio Kotzen cantava as músicas de forma ímpar, com um timbre difícil de se ouvir por aí e afinação impecável. Os solos ainda apareciam, mas o foco eram os refrãos pegajosos e as linhas ‘swingadas’.


A carreira de Richie Kotzen tomou esse rumo e foi assim por um bom tempo, com destaque absoluto fica para o genial “Mother Heads Family Reunion”, de 1994. A exceção é sua participação no álbum “Native Tongue”, do Poison, onde compôs a excelente balada “Stand” e deu uma cara mais adulta para o grupo. Ele também fez a turnê de despedida do Mr. Big no lugar de Paul Gilbert e, só por diversão, aumentava o grau de dificuldade das músicas (que já era relativamente alto) e tocava a famosa introdução de “Green Tinted Sixties Mind” palhetando e não fazendo ‘tappings’, como Gilbert fazia, ou fazendo o solo de “Colorado Bulldog” nas costas, com a guitarra por cima dos ombros. Para piorar, usando uma Telecaster!


Aos poucos, Richie Kotzen foi deixando os solos de lado. Às vezes, nem mesmo tocava, apenas cantava. Gravou muitas músicas acústicas e acabou fazendo shows neste formato e até lançando um disco, “Acoustic Cuts” (2003). Era incrível saber do que Richie Kotzen era capaz de fazer com uma guitarra nas mãos e, mesmo assim, vê-lo feliz no palco apenas com um microfone, um banquinho e um violão, fazendo platéias cantarem suas canções junto com ele. Até mesmo nos ‘workshops’ que faz mundo fora (felizmente presenciei um deles na EM&T) o guitarrista fala mais sobre métodos de composição e timbres e não se porta como muitos que se acham ‘guitar heroes’. Quando demonstra alguma técnica, ao invés dos solos velozes e complicados, faz levadas com a mão direita na guitarra ‘clean’. Vale citar que ele também toca, e muito bem, bateria, baixo e piano.


Por sorte nossa, Richie Kotzen gosta do Brasil e já fez algumas apresentações por aqui, e lançou recentemente um álbum e um DVD ao vivo gravados em São Paulo. Se você gosta de música de qualidade e performances que beiram à perfeição, tanto nos vocais quanto na guitarra, fique atento. Músicos como Richie Kotzen são raríssimos, colocam sempre a arte em primeiro plano, e merecem ser apreciados.